10/11/2016 - 16:30:50
São Paulo: A situação da maioria dos brasileiros com suas contas a pagar sempre foi complicada. Porém, nos últimos anos, a crise econômica evidenciou ainda mais a falta de incentivo à educação financeira: hoje, mais da metade das famílias brasileiras está endividada.
Por outro lado, tais problemas abrem margem para a criação de inovações que os revertam. Uma nova onda de empresas aposta nisso e tem como objetivo superar a complexidade financeira e estimular os brasileiros a ficarem no azul: são as fintechs (saiba mais sobre elas).
Três casos específicos pensam na sua relação com as dívidas: as startups Geru, GuiaBolso e QueroQuitar!. No evento FINTECHclass, que acontece hoje, os fundadores desses negócios contaram suas histórias e responderam sobre como mantêm uma boa relação com os grandes atores do setor de renegociação de dívidas, como os bancos. O painel, chamado ?O futuro do mercado fintech?, foi organizado pela StartSe e ocorreu em São Paulo.
O Geru é uma fintech criada em 2013 pelos fundadores Karin Thiess, Sandro Reiss e Tomás Corrêa. O negócio começou quando os empreendedores avaliaram que há, no país, aproximadamente 230 bilhões de reais em crédito com juros acima de 100% ao ano.
?Não é possível que haja tantos mal pagadores assim no país, a ponto de terem de pagar uma taxa dessas?, defende Reiss. Por isso, os empreendedores criaram uma plataforma de empréstimo totalmente online onde o usuário pode solicitar um empréstimo a partir de cinco mil reais, com taxas de juros que variam de 25 a 80% ao ano. O pagamento deve ser feito em até 36 meses.
?Nossa empresa se inspirou em um modelo de fora do país, chamado de marketplace lending. Nele, você aproxima uma pessoa que investe a outra que precisa tomar crédito emprestado, em uma relação mutuamente benéfica: o investidor se beneficia do retorno mais alto que os empréstimos bem concedidos podem gerar, ainda que corra mais risco; e o comprador paga juros menores e tem uma experiência de consumo muito mais gratificante.?
O usuário entra na página da Geru e pode fazer simulações e um cadastro. Depois, recebe uma proposta de empréstimo. Se ele aceitar, faz uma assinatura eletrônica e provê documentos, uma foto de rosto e um comprovante de endereço. O Geru faz a verificação dos dados em um dia e, se o usuário for aprovado, o dinheiro cai em sua conta em no máximo dez dias. A partir daí, ele pode acompanhar seu esquema de pagamento por meio da própria plataforma.
O GuiaBolso foi fundado pelos sócios Benjamin Gleason e Thiago Alvarez, com a proposta de unir impacto social, serviços bancários para pessoa física e acesso digital.
?Os dados das pessoas estão nos bancos e há um exército de funcionários analisando tais informações, com o viés dado por cada instituição financeira. Mas não tem ninguém analisando esses dados com a visão do consumidor, devolvendo a informação para essas pessoas?, explica Alvarez. ?Nascemos justamente com a missão de transformar a vida dos brasileiros, por meio de um aplicativo que gerencia o dinheiro automaticamente.?
O GuiaBolso adotou como diferencial puxar todas as transações contidas no extrato bancário e fazer as categorizações, sem precisar que o usuário faça esse trabalho manualmente. O app faz desde esse controle mais simplificado até a definição de metas (quanto a pessoa quer gastar por categoria).
Porém, nem todo mundo acreditou na ideia. Alvarez e Gleason ouviram ?não? mais de 60 vezes até conseguiram um total de investimentos no valor de R$ 90 milhões. Lançado em 2014, o GuiaBolso já conta com três milhões de usuários hoje. Segundo Alvarez, após quatro meses de uso, o usuário vai de uma economia de R$ 307 para R$ 738. Saiba mais sobre o GuiaBolso.
O Brasil possui 60 milhões de pessoas negativadas, o que representa 40% da população economicamente ativa sem acesso ao crédito e, portanto, ao consumo de maior valor. Marc Lahoud, que trabalhou mais de 20 anos no setor de varejo, queria resolver esse problema a partir do uso da tecnologia.
Seu grande objetivo era estabelecer uma relação mutuamente benéfica entre devedor e credor: o consumidor recupera sua vida financeira, enquanto os financiadores podem recuperar o crédito sem desgastar sua relação com o ex-inadimplente.
?Queremos que esse devedor recupere seu status de consumidor, preferencialmente da própria empresa para a qual ele estava devendo. Em um país com tantos inadimplentes, não tem como uma empresa se recusar a atender quem está devendo ou já deveu para ela?, diz Lahoud.
O resultado dessa ideia foi a QueroQuitar!: uma plataforma que faz a quitação de dívidas ser mais simples tanto para o usuário quanto para a empresa cobradora, eliminando intermediários.
?Criamos um ambiente próprio para que o consumidor resolva seu crédito, sem intervenção humana e cobranças insistentes. O devedor toma a iniciativa de renegociar, entrando na plataforma; Assim, as boas relações entre ele e a instituição financeira são mantidas; o serviço de quitação está disponível 24 horas por dia; e a empresa cobradora tem menor custo operacional.?
Segundo Lahoud, todo esse serviço atua em prol de uma objetivo maior do que apenas recuperar crédito. ?O futuro é agregar muito mais que uma nova plataforma de negociação: é trazer uma nova proposta de valor e inverter a relação tradicional entre instituição cobradora e devedor. É a inovação criando uma nova cultura de recuperação de crédito.?
Com menos de dois anos de negócio, a QueroQuitar! possui cerca de 1,3 milhão de CPFs cadastrados e já faz parcerias com grandes empresas, como Bradesco e Vivo.
Como é de esperar, toda disrupção de mercado envolve um atrito entre os que já estavam presentes no setor e os recém-chegados: no caso, os grandes atores do sistema financeiro e as fintechs. Então, como essas startups estão convivendo com os bancos?
Reiss, da Geru, avalia que muitos grandes players ainda não abraçaram a inovação inspirada pelas fintechs, exceto em alguns aspectos da área de experiência ao cliente. ?Os bancos ainda têm muito receio de mexer com novas linhas de crédito e novos perfis de clientes?, defende o empreendedor.
Mesmo assim, já há exemplos de uniões que deram certo no país. No caso da QueroQuitar!, o desafio estava em relacionar-se com as agências de cobrança, que fazem o trabalho de contatar os clientes inadimplentes de diversas instituições. Defender a fintech como complemento e não como substituição foi a forma encontrada de agradar tais assessorias.
?Como nosso discurso sempre foi de parceria e não de conflito, eles viraram brokers no nosso marketplace. Ou seja, eles possuem carteiras que precisam recuperar e usam a plataforma para isso?, explica Lahoud. ?Foi mais uma visão de como isso pode beneficiar ambos e não entrar no mercado tentando quebrar todo mundo. Estamos em uma fase mais madura do setor financeiro, onde é possível construirmos algo junto aos players tradicionais do mercado.?
?A gente tem de trabalhar junto a instituições financeiras?, endossa Alvarez. ?No momento, estamos abraçando todas as instituições financeiras que queiram fazer parceria com o GuiaBolso, inclusive ajudando a melhorar a experiência delas no ramo de contratações online. Só levamos em consideração se é um bom produto, com taxas atraentes, e se ele fornece uma boa experiência ao usuário.?
Fonte: Exame.com